O que anda errado com o design para a terceira idade

Crédito: Fast Company Brasil

Claudia Penteado 4 minutos de leitura

Para a maioria de nós, pensar em envelhecer traz imagens de golf, relaxamento e viagens de trailer – imagens idílicas, mas altamente datadas. Nossas mentes também vagam por estereótipos como botões de pânico para idosos e apoios nas paredes do banheiro. Resumindo: os produtos para as pessoas mais velhas são um mar deprimente de bege e aço inox. 

Dez mil pessoas fazem 65 anos todos os dias nos Estados Unidos e toda a geração baby boomer terá 65 anos até 2030. Mas a realidade da vida após os 65 anos normalmente é muito mais rica e diversificada do que sugerem os estereótipos culturais. Os adultos mais velhos estão vivendo mais tempo e têm objetivos e metas grandiosos e dinâmicos. Eles estão abrindo novos negócios, usando novas tecnologias e experimentando novidades. Também são a faixa etária com mais dinheiro, concentrando 53% da riqueza, de acordo com dados do Federal Reserve. Além disso, as pessoas com mais de 50 anos são os responsáveis por cerca de 50% do consumo.

A oportunidade de usar ótimos designs em produtos e serviços para adultos mais velhos é enorme, mas para fazer isso com sucesso será necessário olhar para além das narrativas enraizadas sobre este grupo e envolvê-los no processo de design. Mais importante: deveríamos nos forçar a pensar em maneiras de desenvolver designs para vidas mais ricas, conectadas e com propósito – e não somente mais longas. Então, como nos livrar das nossas visões tradicionais de design para este mercado gigantesco de pessoas que estão envelhecendo?

COMECE COM O ENQUADRAMENTO

Palavras importam há uma oportunidade de repensar o que significa envelhecer, uma vez que a linguagem que usamos hoje não serve para descrever este estágio da vida tão cheio de nuances e variáveis. O primeiro passo para um design mais inclusivo com relação à idade é enquadrar todas as possibilidades desse período da vida – no lugar de focar naquilo que não é possível. 

FrameWorks Institute fez um bom avanço nesse sentido, criando uma biblioteca de pesquisas e ferramentas sobre o impacto das palavras que usamos e como elas podem atrapalhar a inovação, as políticas e o progresso. Diz um dos trechos: “O reenquadramento do problema [do envelhecimento] requer um rompimento com a alienação das pessoas mais velhas e uma mensagem de que a velhice, assim como todas as idades, possui desafios e oportunidades. Por quê? Nossa pesquisa mostra que suposições negativas sobre o envelhecimento levam as pessoas a dissociar-se do envelhecimento e assumir a posição pessimista de que nada pode ser feito para melhorar suas condições.”

Exemplo desta “alienação” são os típicos dispositivos de auxílio doméstico projetados para idosos. Eles resolvem um problema específico para pessoas com dificuldades de mobilidade, mas seu design é “alienador.” Muitos destes produtos possuem uma característica clínica, quase hospitalar, que grita “velho”, “frágil” e “sem graça”. Da mesma forma, faltam marcas e ideias que reconheçam o potencial e a riqueza da vida após os 65 – ou, porque não, que haja vida após os 65.


Chip Conley e outros como ele estão prestando atenção neste problema, focando naquilo que é possível no lugar do que não é. Conley reconheceu que a ideia de uma carreira de 40 anos seguida por uma aposentadoria sedentária está desatualizada, o que fez com que ele fundasse a Modern Elder Academy (MEA). A MEA fornece aos mais velhos o espaço e as ferramentas para repensarem suas vidas e reconhecer na meia idade um renascimento, ao invés de um pico seguido pelo declínio. A academia ajuda os alunos a se reinventarem através da aquisição de novas habilidades, da requalificação, de mentoria e da troca de experiências – até encontrar uma segunda ou terceira carreira. Este tipo de apoio pode ser inestimável para as pessoas repensarem seus objetivos e também sua contribuição para com suas comunidades.  

Conforme disse o professor de design Jeremy Myerson em um TED Talk, “precisamos decidir se queremos uma vida com muitos anos ou muitos anos com vida.” Ele argumenta que precisamos fugir de um modelo médico, no qual o envelhecimento é visto como uma doença que precisa ser tratada e irmos para um modelo social onde o design é usado para manter os mais velhos integrados à sociedade. Pode parecer uma pequena mudança, mas demanda muita energia e muito foco, pois nossas narrativas e estereótipos culturais negativos sobre o envelhecimento estão profundamente enraizados.

DESIGN PARA E COM OS MAIS VELHOS

Para redefinir a experiência do envelhecimento, as marcas e os designers precisam envolver os mais velhos no processo. Estamos começando a ver empresas como a Eargo aplicando uma abordagem centrada no ser humano para categorias focadas no envelhecimento (no caso da Eargo, aparelhos auditivos) para criar produtos que sejam desejáveis, não somente funcionais. “É uma amplificação das habilidades, não uma deficiência,” de acordo como o sócio da empresa de design Matt Rolandson. Ouvindo meticulosamente as reais necessidades do mercado e fazendo o design de acordo com elas, a Eargo abriu seu capital em outubro de 2020 com uma oferta inicial de ações de US $141 milhões.


SOBRE A AUTORA

Claudia Penteado é editora chefe da Fast Company Brasil. saiba mais