Incentive a Diversidade, mas fuja do Diversity Washing

Crédito: Fast Company Brasil

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Iniciei minha jornada no mercado publicitário em 2005 num outro contexto de Brasil e de mundo. De lá para cá, tive 15 diferentes experiências profissionais — se somadas as agências, as universidades e as consultorias onde atuei como planejamento e no desenvolvimento de estratégias criativas para comunicação de marcas nas mídias sociais.

Quantas chefes mulheres eu tive? Umas seis. Quantos chefes negros eu tive? Apenas dois. Quantas mulheres negras com uma relação hierárquica maior do que a minha eu vi? Nenhuma. Nem mesmo em outras áreas, departamentos ou como clientes. Cresci na minha jornada profissional vendo mulheres e homens negros restritos à copa, à segurança ou aos serviços gerais.

Essa pequena amostra da minha vida profissional poderia ser nada mais do que uma coincidência, mas experimente fazer este exercício para perceber que não se trata de uma coincidência. É apenas o racismo estrutural se manifestando em nossas carreiras, o que nos traz a certeza de que é urgente mudar. E, felizmente, o mercado de trabalho – não só da publicidade — já tem dado sinais dessa mudança.

Patrícia Moura (Crédito: Divulgação)

Hoje eu tenho a sorte de ser a diretora negra que eu não tive. Lidero duas unidades de negócio no A-LAB Content Lovers e tenho a maior e mais competente equipe que poderia sonhar em ter. E nessa jornada eu quero compartilhar com pessoas dispostas a fazer transformações dentro do seu próprio mercado.

Penso que para ser um agente de transformação – qualquer profissional, em qualquer contexto – deva estar devidamente munido de dados e argumentos para influenciar equipes, C-level e investidores a fazer mais pela diversidade em suas organizações. Portanto, a seguir quero contribuir com exemplos positivos de corporações que vêm se posicionando, e também com exemplos negativos, os quais devemos evitar.

O passo básico dessa transformação é admitir que a diversidade atende a uma ordem prática: resultados. E existem inúmeros estudos que hoje comprovam isso, como por exemplo o da McKinsey & Company de 2018, que apontou que companhias com maior diversidade de gênero em cargos de liderança tem 21% mais chances de apresentar resultados acima da média do mercado. No caso da diversidade étnica, esse número sobe para 33%.

O segundo passo é perceber que, pautado em dados, o mundo corporativo está se movendo na direção da inclusão de gênero, raça e grupos minorizados. Não à toa, a partir deste ano, o banco Goldman Sachs passou a recusar IPOs de organizações que não tenham diversidade nos seus conselhos de administração. O motivo, segundo a própria empresa, é que a performance financeira de quem tem ao menos uma diretora é significativamente melhor – o que reafirma o estudo que mencionei.

Não por acaso, citando o Brasil, o Magazine Luiza foi motivo de discussão até no Ministério Público do Trabalho por conta do seu processo seletivo para estudantes negros se tornarem trainees. Processo este endossado pelo MPT, diante da legalidade da ação afirmativa da empresa.

Nesse contexto, é lógico que algumas empresas podem se sentir pressionadas a agir e, sem dúvida alguma, desenvolver campanhas de comunicação parece ser o caminho mais fácil. Porém, quero chamar atenção para uma geração que está absolutamente atenta nas redes sociais e no mercado para “movimentos duvidosos”, hoje já (re)conhecidos pelo termo “diversity washing”.

Na prática, a empresa que pratica o diversity washing pode até ter aumentado a representatividade da sua publicidade nos últimos anos, mas a foto de fim de ano no Linkedin frequentemente denuncia que a atitude ficou apenas da porta para fora;

A empresa que pratica o diversity washing pode até ter mulheres negras em cargos de coordenação, mas na diretoria ou no board executivo…nenhuma mulher, quiçá negra.

A empresa que pratica o diversity washing pode até dizer que atende um público diverso, mas em suas rotinas, limita a forma com que seus funcionários LGBTQIA+ se expressam. Ou pior: não corrige comportamentos homofóbicos que possam ocorrer nos chats de Teams ou grupos de Whatsapp.

A empresa que pratica o diversity washing não perde tempo em postar um quadrado preto em apoio à população negra, mas não gasta um centavo com processos afirmativos ou treinamento do quadro de funcionários.

Pois bem, sem precisar traduzir ou explicar a origem do termo, é fácil entender o que diversity washing significa.

É preciso que a empresa vá além – pelo bem da sua própria longevidade, pelo bem da retenção de talentos e da sua capacidade de inovação e disrupção que nascem de ideias divergentes e, por fim, pelo bem da evolução do terrível quadro que limita o potencial socioeconômico, intelectual e laboral do país.

Ações de diversidade e inclusão precisam ser tomadas em duas vias: para fora sim, mas para dentro de forma ainda mais relevante. E a melhor maneira de fazer acontecer é tecer compromissos públicos, desenhar metas claras e mensuráveis. E, por favor, indo muito além de reinventar o termo black friday — que nunca afetou ninguém e nem vai mudar a dinâmica de como as pessoas pretas compram ou deixam de comprar em novembro.


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