Por dentro de “The Stone Age”, a exposição mais brisada de Nova York

Crédito: Fast Company Brasil

Claudia Penteado 5 minutos de leitura

Esta não é uma exposição sobre homens das cavernas. É uma exposição sobre maconha. 

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

Já estava na hora de Nova York ter a sua própria exibição sobre cannabis. À medida que o uso recreativo da planta vem sendo legalizado nos EUA nos últimos anos — Washington e Colorado vieram em primeiro lugar em 2012 e Nova York se juntou ao ranking em março de 2021 –, uma série de museus temáticos e experiências imersivas surgiram ao redor do país, do Museum of Weed em Los Angeles ao tão esperado Cannabition em Las Vegas.

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

Localizado no bairro de Chelsea, o empreendimento foi inaugurado na semana passada e ocupa mais de 800 metros quadrados. É uma exposição divertida com a séria missão de desestigmatizar a maconha e explorar a relação complicada da planta com o encarceramento em massa, justiça social, epidemia de opióides e bem-estar sexual. Oito artistas de rua apresentam suas obras — alguns deles já foram pessoalmente impactados pela criminalização da cannabis. 

The Stone Age leva os visitantes a uma viagem através dos sentidos, despertando mais consciência sobre uma planta que foi mal compreendida e usada como ferramenta de discriminação por mais um século.

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

Para que fique registrado, esta não é uma exibição centrada no consumo de cannabis (não é distribuída nas instalações nem cannabis medicinal nem recreativa, embora a seção de FAQ do site diga que o visitante é encorajado a fazer o que quiser para “melhorar” a sua experiência de antemão). Este é um programa sobre conscientização. “Para nós, a maconha é muito mais do que conseguir uma brisa”, relata Sasha Perelman, que organizou a exposição ao lado de Elizabeth Santana. Juntas, Perelman e Santana produziram centenas de eventos para marcas de cannabis, bem-estar e outras indústrias. “Há muitas conversas em que a maconha se torna catalisadora para o que estamos realmente animadas em trazer neste espaço e promover um diálogo”, revela Perelman.

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

Essa conversa começa com uma exposição de quatro ambientes sobre bem-estar sexual. Na primeira sala há um grande pêndulo balançando acima de uma floresta vertical de fósforos, quase tocando a superfície e evocando um sentimento de presságio. A última sala apresenta uma escultura etérea de LED com luzes pulsantes. Dentro dela há um núcleo vermelho evocativo. Projetada pelo artista e designer do Brooklyn, Jason Krugman, a luz é uma interpretação escultural de como é um orgasmo. 

Esta parte da exposição sugere a relação entre cannabis e prazer. “A maconha ajuda a liberar dopamina, o que não afeta apenas nossos receptores e vias nervosas, mas também melhora nosso tato ou olfato”, comenta Perelman, observando que a planta pode ser particularmente útil para pessoas que têm dificuldade para se sentirem confortáveis ​​fisicamente, e também mentalmente.

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

A exibição então passa a retratar a relação de longa data entre cannabis e criatividade (uma cabine de DJ permite ao visitante compor sua própria batida), antes de assumir um tom mais sombrio. Em um canto branco do espaço, há o que Santana chama de um “tornado de prescrições”, se retorcendo do chão. “O vício e a epidemia [de opióides] não começaram na rua, começaram atrás do balcão com alguém fazendo uma prescrição”, ela diz.

Em 2016, 2,5 milhões de americanos lutaram contra o vício em opióides e mais de cem pessoas morrem de overdose de drogas todos os dias nos EUA. A exposição indica que existe uma forma mais natural de cura. “Os benefícios da cannabis como um medicamento natural para aliviar a dor podem não apenas ajudar na abstinência de opióides, mas também abrandar a necessidade de experimentá-los em primeiro lugar”, afirma Perelman. De acordo com um estudo de 2019 publicado no American Journal of Psychiatry, o óleo de CBD reduziu significativamente a abstinência e a ansiedade em pacientes que estavam se desintoxicando de drogas opióides, o que poderia tornar a desintoxicação mais tolerável e também diminuir a chance de recaída.

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

Grande parte da exposição é focada no potencial multifacetado da cannabis, mas a droga também tem um histórico racista. Uma linha do tempo mostra como as campanhas anti-maconha têm sido usadas para demonizar a planta desde a Lei de Imposto sobre a Maconha de 1937 — que visava especificamente as minorias e os afro-americanos. Harry Anslinger, o homem que declarou a guerra às drogas, é citado abaixo da timeline com uma citação revoltante: “Necrotérios fazem os negros pensarem que são tão bons quanto os brancos”.

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

De acordo com um relatório de 2020 da American Civil Liberties Union, os negros nos EUA têm quase quatro vezes mais probabilidade de serem presos por porte de maconha do que os brancos, embora ambos os grupos usem a planta em proporções semelhantes. Em 2018, mais de 450 mil pessoas cumpriam pena por drogas — dois terços delas eram negras. E esse número é particularmente impressionante, considerando que o uso recreativo de cannabis agora é legal em dezoito estados. Na Stone Age, a equipe trabalhou em parceria com a Last Prisoner Project — uma organização sem fins lucrativos que advoga pela liberdade desses prisioneiros não violentos — e encomendou obras de arte de indivíduos que foram encarcerados ou estão atualmente. (Os originais estão disponíveis para compra na loja de souveniers; todos os lucros serão destinados aos artistas).

(Crédito: cortesia de The Stone Age)

A exposição termina em uma cela de cadeia. Passando por um mural pintado por uma artista que já foi presa (e escolheu permanecer anônima), os visitantes entram em uma cela sombria e cinza com uma cama franzina no canto e uma projeção penetrante de centenas de marcas de contagem preenchendo lentamente a parede. Dependendo de como o crime é classificado, as condenações por crimes relacionados à maconha variam de cinco dias a quinze anos. “Vinte e quatro horas por dia sem liberdade”, lamenta Santana.

Em essência, a The Stone Age usa a cannabis como um veículo para explorar questões maiores. “Essas são muitas das conversas que deixam várias pessoas desconfortáveis”, destaca Perelman. “Queremos criar um espaço onde, de uma forma divertida, lúdica e instigante, possamos suscitar esses tipos de diálogos e começar a criar uma nova narrativa e criar mais progresso.”

The Stone Age acontecerá por tempo limitado (a data exata de encerramento ainda será definida). Os ingressos estão disponíveis a partir de US$ 45. Uma parcela da arrecadação será doada ao Last Prisoner Project.


SOBRE A AUTORA

Claudia Penteado é editora chefe da Fast Company Brasil. saiba mais