Redes sociais e o aumento dos distúrbios alimentares entre adolescentes

Crédito: Fast Company Brasil

Adele Peters 3 minutos de leitura

Quando eu tinha 15 anos, fui diagnosticada com anorexia. Eu consegui me recuperar completamente, ao contrário de muitas pessoas que conheço, mas foi uma batalha difícil.

Uma coisa pela qual sou grata é que nos anos em que sofri mais gravemente com a doença, os jovens ainda não estavam expostos ao Instagram, com seu fluxo contínuo de posts mostrando imagens de corpos inatingíveis. Mas eu tinha Facebook.

Lembro-me perfeitamente de voltar para casa depois do tratamento e imediatamente reconectar-me pelo Facebook com amigas em recuperação. Eu passava todas as noites no desktop da nossa família me comparando a elas. Será que elas perderam mais peso? Será que estavam de volta ao tratamento? Naquela época, foi imensamente confortante estar conectada com pessoas que eu considerava “mais doentes” do que eu.

Para alcançar a verdadeira recuperação, aprendi a afastar as pessoas que estavam me influenciando a emagrecer. Aprendi a passar mais tempo interagindo com colegas que, como eu, estavam focadas na recuperação, em vez de rolar o feed aleatoriamente vendo fotos de corpo inteiro dos outros. Aprendi a limitar meu tempo no Facebook e a construir relacionamentos na vida real.

Recentemente, o mundo parece ter se dado conta de algo que sobreviventes como eu já sabem há anos: as mídias sociais estão contribuindo para um número crescente de homens e mulheres que lutam contra uma série de transtornos de imagem corporal: desde uma relação doentia com a comida e com exercícios até um transtorno alimentar completo. Ainda há necessidade de pesquisas mais abrangentes sobre esse impacto, mas os relatos falam por si. Sei disso porque os ouço na linha de frente todos os dias.

Sabemos que os adolescentes passam, em média, sete horas por dia nos celulares, e muitos passam a maior parte desse tempo nas redes sociais. Sou mentora de uma jovem que recentemente me mostrou seu feed do Instagram: metade dele é de pessoas que ela conheceu em seu tratamento, e que estão lutando para recuperar a saúde. Só que a outra metade é cheia de influenciadores sugeridos pelos algoritmos, ou então de colegas da escola que estão frequentemente usando ferramentas de edição e de embelezamento para “melhorar” suas fotos. Durante a pandemia, ela me disse que passava até 10 horas por dia no Instagram, o que a conduzia a espirais diárias de autodesprezo e de restrição alimentar.

É quase impossível convencer adolescentes como essa jovem a deletar o Instagram. Mas existem ações imediatas que podemos tomar para reduzir os danos e ampliar o lado positivo das mídias sociais.

Tento fazer a minha parte, compartilhando no meu feed pessoal do Instagram, visto pelos adolescentes com quem trabalho, exemplos de como eles podem fazer uma curadoria de perfis voltados para a saúde e para a recuperação. Eu sugiro que eles sigam influenciadores do movimento body positive, já que a positividade corporal questiona os padrões de beleza atuais e foca na aceitação de todos os corpos, independentemente de tamanho e da forma. Também compartilho meus relatos favoritos sobre recuperação de distúrbios alimentares e textos de conscientização sobre saúde mental. Eu sugiro, ainda, assistir a Lives com pessoas que se recuperaram e que podem servir de inspiração, além de outras transmissões, com usuários fazendo coisas interessantes que não tenham necessariamente a ver com comida e corpo.

Essas interações que tive com adolescentes podem parecer gestos pequenos e simples, mas eles podem ter um grande efeito cascata.  Agora, cabe ao Instagram e ao Facebook assumirem a responsabilidade de replicar esse trabalho em grande escala. Poderíamos reduzir significativamente os danos desses ambientes, e até usá-los para aumentar o bem-estar mental, o senso de comunidade e a satisfação corporal, se usássemos as mídias sociais da maneira certa. Por parte das redes sociais, será preciso demonstrarem honestidade, introspecção e colaboração com os líderes de comunidades, mas acredito que existem maneiras de tornar essas plataformas mais seguras para os adolescentes.

Nesse ínterim, precisamos garantir que um tratamento de qualidade esteja acessível a todos que sofrem de transtornos alimentares – afinal de contas, sabemos que elas representam a segunda doença mental que mais leva à morte no mundo. Por enquanto, infelizmente, 80% dos 30 milhões de americanos que desenvolvem um transtorno alimentar nunca receberão tratamento e menos de 5% terão acesso a um tratamento que funcione. Temos a responsabilidade de diminuir os danos das plataformas de mídia social como o Instagram, e uma responsabilidade ainda maior de garantir que, se as pessoas adoecerem, elas terão os recursos de que precisam para se curar totalmente.


SOBRE A AUTORA

Adele Peters é redatora da Fast Company. Ela se concentra em fazer reportagens para solucionar alguns dos maiores problemas do mundo, ... saiba mais